O Legado de Kandinsky
O artista foi quem inseriu pela primeira vez na arte, o conceito de sinestesia através de sua sensibilidade aguçada, percebendo a relação entre cores, musicalidade e movimento, e sugerindo uma relação entre diversas artes (música e pintura). Sua influência para o entendimento do termo sinestesia e suas possibilidades foi marcante e digna de nota até o presente momento dentre pesquisadores que tentam destrinchar o fenômeno.
Kandinsky, considerado pai do abstracionismo, sem sombra de dúvidas deixou uma descendência artística, sendo o pintor que teve a elaboração não só artística como filosófica mais elaborada do movimento, imputando-a não só como uma categoria artística, mas também uma filosofia particular.
O abstracionismo de Kandinsky criou raízes e se alastrou por diversos segmentos, teve uma vertente geométrica representada por Kasimir Malevich (1870-1935) que defendia uma geometria suprematista com obras como Quadrado Preto Suprematista (1914-1915) e Quadrado Branco Sobre Fundo Preto (1918), tendo em suas obras, por sua vez impacto sobre o construtivismo de Alexander Rodchenko (1891-1956) e no realismo dos irmãos A. Pevsner (1886-1962) e N. Gabo (1890-1977). Piet Mondrian e Theo van Doesburg vieram com uma tendência de abstração geométrica baseadas na revista De Stijl (1917) que tem o propósito de encontrar nova forma de expressão plástica imune a sugestões representativas. Suas construções se pautam na utilização de elementos mínimos, linhas retas, retângulos e cores primárias junto com as cores preta, branca e cinza. As tendências da De Stijl reverberaram nos grupos Cercle et Carré (1930) e Abstraction Crèation (1931) na França e no Circle (1937), na Inglaterra.
Com o término da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), Europa e Estados Unidos presenciaram desdobramentos da pesquisa abstrata. Ocorreu o tachismo europeu que tinha uma associação com a abstração lírica e tinha como objetivo a tentativa de superação da forma com a ultrapassagem dos conteúdos realistas e dos formalismos geométricos. Enquanto os trabalhos de Hans Hartung (1904) e Pierre Soulages (1919) se inspiram nos gestos, as obras de Jean Fautrier (1898-1964) e Jean Dubuffet (1901-1985) de Alberto Burri (1915-1995) e Antoni Tàpies (1923-2012) estão mais propensas a matéria.
A representação norte americana do abstracionismo se dá com o expressionismo abstrato de Jackson Pollock (1912-1956) e Willem de Kooning (1904-1997) que tem como pressuposto a eliminação da noção de composição. Ad Reinhardt (1913-1967), Jasper Johns (1930) e Frank Stella (1936) retomam as pesquisas geométricas atípicas do expressionismo abstrato.
No Brasil, o abstracionismo esteve presente com as obras de Manabu Mabe (1924-1997) e Tomie Ohtake (1913) que possuem uma afinidade com o abstracionismo lírico, com adesão posterior de Cícero Dias (1907-2003) e Antonio Bandeira (1922-1967). Uma apropriação do movimento ocorreu mais tarde, nos anos 80 com a obra de Kooning pelo artista Jorge Guinle (1947-1987). Os representantes da abstração geométrica brasileira encontram-se reunidos primordialmente no movimento concreto de São Paulo, do Rio de Janeiro e do neoconcentrismo.
Atualmente o nome de Wassily Kandinsky e sinônimo de arte moderna, um opositor das tradições artísticas ocidentais. Seu legado estético nos mostra não somente um artista que recusou a função figurativa da pintura para valorizar a forma, mas também um criador de uma definição psicológica que teria grande importância nos dias atuais, revolucionando até mesmo a relação existente entre obra e espectador com seus princípios sinestésicos.
A trajetória de Kandinsky deixou um rastro de importante revolução cultural, além de uma intensa influência nos movimentos vanguardistas do século passado.